Ensaio: "Este Livro É Gay" e a polêmica da transfobia de J.K. Rowling

E no mês do Orgulho LGBTQI+ vamos falar sobre o assunto em mais um ensaio que além de dica de leitura sobre o tema, também trata da polêmica envolvendo a escritora J.K. Rowling.

Título: Este Livro é Gay
Autor: James Dawson
Editora: Martins Fontes
Ano: 2015
Páginas: 293
Onde comprar: Amazon | Livraria Cultura | Submarino

Sinopse: "Este livro é gay trata de uma questão muito importante e, às vezes, de difícil abordagem entre professores, pais e jovens: a sexualidade. Com um texto muito claro e ilustrações engraçadas, o livro lembra um manual. O autor convida os leitores a refletir, de maneira honesta e sem preconceitos, sobre os desejos sexuais de cada um, defendendo, acima de tudo, o respeito às escolhas."

Dia 28 de junho celebramos a primeira movimentação em defesa dos direitos LGBT, no ano de 1979, em Nova Iorque. O que por acaso repercutiu no nascimento do movimento teve como herança o estabelicimento de junho como o mês do Orgulho LGBTQI+.

E para aproveitar o ensejo, decidimos trazer uma questão delicada porém urgente, envolvendo uma as mais bem sucedidas escritoras de todos so tempos, J.K. Rowling, e a aura de transfobia pairando sobre sua imagem.

J.K. Rowling já foi considerada, por muitos de nós, inclusive, como um verdadeiro ícone, principalmente por nos trazer o fenômeno 'Harry Potter'. A saga foi com certeza parte da sua infância ou adolescência - e porque não, idade adulta? Ela nos traz grandes aprendizados a respeito de empatia, lealdade, preconceito, tirania, opressão..., e eu poderia continuar citando lições a se aprender com o universo mágico de Hogwarts... Porém, a autora começou a escorregar nos seus pronunciamentos e agora a situação não é nada boa.


Lá para 2014, durante o escalonamento de elenco para "Animais Fantásticos", descobrimos que Johnny Depp, escolhido para a viver o vilão Grindewald, havia se envolvido em casos de agressão física e moral contra sua então namorada, Amber Heard. O posicionamento da escritora foi omisso e fez com que seu filme sofresse e ainda sofra muitos boicotes, mas nada sério aconteceu, incluindo ao próprio Depp.

A questão é que declarações duvidosas e díspares da imagem que a escritora vem tentando "consertar" não pararam por aí. Recentente, J.K., após realizar algumas postagens tranfóbicas em seu Twitter, desta vez, arrumou um grande problema. Tudo começou em dezembro de 2019, quando J.K. abertamente mostrou apoio à pesquisadora Maya Forstater, que fora demitida de um instituto governamental por cricriticar um projeto que facilitaria pessoas trans a mudarem seu sexo legalmente. Já mais recentemente, a polêmica esquenta, vejam:

Se o sexo não é real, a realidade vivida das mulheres em todo o mundo é apagada. Conheço e amo pessoas trans, mas apagar o conceito de sexo remove a capacidade de  muitos discutirem suas vidas.

Caso você não veja problema algum na declaracão acima, então você deveria ler todo o discurso da escritora, que mesmo numa tentativa de retratação, manteve um posicionamento um bocado preconceituoso (leia tudo em detalhes aqui).

A problemática de tal discurso com relação à transexualidade possui bastante complexidade. Primeiro de tudo, se existe uma preocupação com mulheres cis, não deveríamos acolher os dois grupos e mostrar suporte às suas dificuldades, sem preferências? Segundo, dizer o que é melhor para pessoas trans... Creio que é algo que uma pessoa trans deve fazer. E terceiro, jamais devemos supor que o sofrimento da mulher cis é (maior) ou menor do que o da mulher trans! Não é uma competição!  Que tal pararmos de nos preocupar com alguns sufixos e vislumbrarmos uma sociedade mais equitativa??

Nossa sociedade parece ainda estar atrasada no que diz repeito à comunidade transsexual, mais do que as outras letrinha do "LGBT". E é aqui que entra minha sugestão de leitura para você que não entende nada, mas quer entender, e pra quem entende algo, mas ainda não tudo. Adolescentes e jovens adultos, pais e mães, educadores e tutores de modo geral, todos que desejam ser mais receptivos e compreensivos com a comunidade LGBTQI+  mas ainda não se acostumaram com esse universo.


"Este Livro é Gay", publicado em 2014, na Inglaterra, por James Dawson - que hoje é Juno Dawson, após descobrir-se uma mulher trans - é praticamente um manual de sobrevivência. Ele traz não só dados levantados pela autora e sua própria experiência, mas também conta com depoimentos de mais de 300 pessoas LGBTQI+.

O livro nos traz informação importantíssima que é importante mencionar: o significado do "T" na famosa sigla.

Transgênero: Termo abrangente para pessoas que experimentam com mais de 1 gênero ou transitam entre eles. (Inclua aqui os GenderFluids e Não Binários).

Transexual: Alguém que nasceu no corpo errado. Pode mudar de gênero, com uso de hormônios e intervenção cirúrgica - e claro, psicológica. 

Travesti: Nasceu num gênero mas se identifica com outro, porém não se submete a cirurgia de resignação.

Transformista: Cross Dresser, Drag Queen ou Drag King, usam adereços típicos do sexo oposto, para realizar performances ou apenas se divertir.

Peter Tatchelle, militante LGBTQI+, diz que sonha com o dia em que todos os rótulos vão ser desnecessários e poderemos ser apenas humanos.

Existem diversas teorias que tentam explicar porque pessoas trans são pessoas trans; desde a biologia à psiquiatria. Os dados ainda são inconclusivos. Talvez haja uma diferença química hormonal, talvez os lobos cerebrais sejam diferentes, mas será que é isso mesmo que importa? Lembremos que ser transsexual ou homossexual já foi considerado grave doença mental, e hoje luta-se pela completa despatologização dessas condições. 

A LGBTfobia não ajuda em nada nesse aspecto. A integralização dessas pessoas à comunidade é constantemente problematizada por um preconceito comprovadamente irracional, guiado pelo medo, intolerância, 'verdades absolutas', heranças culturais ultrapassadas. E quando enxergamos da perspectiva institucionalizada da LGBTfobia, percebemos os problemas de visibilidade, representatividade e perpetuação de estereótipos em espaços diversos. Nos recusamos a falar sobre isso, e perpetuamos a homotransfobia velada.

A LGBTfobia pode, inclusive, começar em casa, ou na escola. Muita gente confunde convenientemente liberdade de expressão com discurso de incitação ao ódio (e aqui entra a fala descabida de J.K. Rowling). 

Incitação ao ódio, casa não saibam, é crime.

E por falar em crime, de acordo com Juno Dawson e diversos outros dados, o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo. Comparado a outros países super conservadores, onde ser homossexual dá até pena de morte, isso é extremamente preocupante. 

É verdade que possuímos algumas políticas de apoio, grupos e ONGS especializadas, e algumas turvas legislações a favor desse grupo minoritário. Apesar disso, é extremamente importante saber quem está do seu lado. No Brasil, temos a Anistia Internacional, a All Out, a ABGLT, e muitas ONGS locais, nacionais e internacionais.

Em "Este Livro é Gay", encontramos diversas informações e contatos dessas instituições. Falamos também sobre assuntos tabu, estereótipos e cultura queer, drogas, DSTS, dicas de como sair do armário ou lidar com o bullying e a LGBTfobia, uma bela aula de educação sexual, relacionamentos, filhos, casamento gay... e mais um sem número de informações divertidas, leves, dinâmicas, e muitas ilustrações de arrancar gargalhadas. Talvez a J.K. Rowling devasse dar uma olhadinha nesse livro também...

Quem é que decide o que é normal e o que não é? Que palavra horrorosa e excludente.

O Blog Mundos dos Livros apoia a comunidade LGBTQI+ e acredita no amor em todas as suas manifestações. 🌈

--- Lorena Macêdo ---

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