Resenha: Garoto Encontra Garoto por David Levithan

Sempre tive curiosidade em ler um romance que tivesse, como pano de fundo, temáticas GLBT, pois queria ver como os autores abordavam esse tipo de tema, ainda considerado polêmico em diversas partes do nosso globo. Sendo David Levithan um dos "novos queridinhos” entre os jovens leitores, ao lado de John Green, resolvi juntar a fome com a vontade de comer e passar a conhecer o trabalho deste ator. Vamos desbravar essa pequena cidade norte-americana que tem tantas peculiaridades, que o fato de ser “gay-friendly”¹ torna-se uma característica bem singela.

Título: Garoto Encontra Garoto
Autor: David Lavithan
Editora: Galera Record
Ano: 2014
Páginas: 240
Onde comprar: Saraiva | Submarino
Paul estuda em uma escola nada convencional. Líderes de torcida andam de moto, a rainha do baile é uma quarterback drag-queen, e a aliança entre gays e héteros ajudou os garotos héteros a aprenderem a dançar. Paul conhece Noah, o cara dos seus sonhos, mas estraga tudo de forma espetacular. E agora precisa vencer alguns desafios antes de reconquistá-lo: ajudar seu melhor amigo a lidar com os pais ultra religiosos que desaprovam sua orientação sexual, lidar com o fato de a sua melhor amiga estar namorando o maior babaca da escola e, enfim, acreditar no amor o bastante para recuperar Noah.


David Levithan é um autor de livros young adult², em que a grande característica da maioria de seus escritos é a presença de um protagonista homossexual forte. Em Garoto Encontra Garoto, seu primeiro romance publicado, isso fica bem claro.

Paul é um rapaz que vive em uma pequena cidade norte-americana, cujo nome não foi mencionado durante a narrativa. A principal característica dessa cidade é ser “gay-friendly”, sendo assim, os habitantes da mesma não tem qualquer tipo de problema com casais homossexuais nas ruas, nem ocorrências de homofobia. O próprio Paul, desde muito jovem, já sabia ser bem diferente e não teve qualquer problema em aceitar isso e “externalizar” sua posição enquanto homossexual. Ele é descrito como alguém totalmente seguro de si e suas convicções. Seus pais e irmão não tem qualquer tipo de problema quanto a isso, fornecendo ao garoto um lar harmonioso, enquanto crescia e aprendia mais sobre si.

Entre seus amigos íntimos temos Joni e Tony. Joni é sua melhor amiga desde a primeira série. Ela e Paul sabem tudo um do outro e a garota vive um eterno relacionamento separa-reconcilia com Ted, um rapaz boa praça, mas que tem seus lapsos de babaca. Tony seria o outro melhor amigo de Paul. Também é gay, porém, diferente de nosso protagonista, não é tão seguro de si. Seus pais são extremamente religiosos, fazendo com que o garoto tenha que mentir em diversas vezes para poder sair com os amigos.

Ainda importantes para a história, temos Infinite Darlene e Kyle. Infinite Darlene é a super celebridade da escola. Se seus 1,90 metros de altura e o título de principal quaterback³ da escola já não lhe bastassem, ela ainda é uma transexual e Rainha do Baile, sendo diversas vezes um alívio cômico na história. Kyle é um ex namorado de Paul, que rompeu com o rapaz por motivo algum e evita o garoto de todas as maneiras, além de ter contado mentiras a respeito do mesmo após o término.

A história do livro se inicia quando, em uma saída com Joni e Tony, Paul encontra com Noah, acontecendo o tão famoso “amor à primeira vista”. Noah é um rapaz novo na cidade e, conforme vão se conhecendo, Paul tem a certeza que ele é “o cara da sua vida”. Só que, em determinada parte da história, Paul acaba cometendo uma falha e precisará contar com a ajuda de seus amigos para ter seu amado de volta, enquanto lida com um novo namorado de Joni, que faz ela mudar completamente e auxilia Tony a enfrentar os pais.

O livro segue aquela velha receita de bolo: “Garoto encontra Garota, Garoto perde a Garota, Garoto conquista a Garota”, sendo como novidade esse tipo de dinâmica estar envolvendo um casal homossexual. Narrado semre em primeira pessoa pelo Paul, acompanhamos sua vida, a descoberta desse novo amor e o método usado pelo mesmo para conseguir esse amor de volta. O livro em si é bastante leve e descontraído, podendo ser devorado pelos amantes de histórias românticas bem rapidamente.

Mas, como bom chato que sou, o livro teve diversas peculiaridades e pontos que me incomodaram...

Não sei se por conta de minha total e absoluta ignorância quanto a como funciona as cidades americanas que apoiam causas homossexuais, mas a dinâmica da escola e comunidade, de um modo geral, me gerou bastante estranheza. Não tenho problema algum com Infinite Darlene ser uma drag Queen e rainha do baile, mas, a meu ver, seja colocando ela nessa posição e ainda sendo a quaterback do time de futebol americano, ou mesmo as tais líderes de torcida com suas Harley Davidson foram elementos um tanto forçados na história, por puro objetivo de atrair leitores (isso sem falar na tal festa dentro da livraria, que foi a coisa que menos entrou na minha cabeça).

Outro aspecto que me deixou um tanto desapontado foi o fato de não termos qualquer tipo de personagem profundo na história. Se por um lado, fazer um protagonista totalmente seguro de si foi uma boa sacada, por outro lado ele acabou por torná-lo um tanto “plano” dentro da história. Mesmo o Tony, que é o personagem que mais me chamou a atenção dentro da narrativa, é quase tão superficial quanto o protagonista. Todas as tramas começadas não tem qualquer tipo de aprofundamento e o final foi tão “whatever” eu em nem acreditei que tinha acabado.

Na minha humilde opinião de leitor, o último capítulo do livro, que é isolado do resto da história e focado na Infinite Darlene, é o capítulo que mais condiz, seja com o título do livro, ou mesmo com o que o autor queria abordar com a história. Pra mim, se ele tivesse lançado só aquele capítulo como conto teria bem mais peso à temática.

Sendo um primeiro livro do autor, ele intriga enquanto ao tema do livro, mas deixa a desejar no desenvolvimento da narrativa. Curiosidade sanada, mas não creio que voltarei a David Levithan tão cedo...

“Quando você existe como criação própria, ou seja, quando você se dedicou a criar a si mesmo, às vezes é difícil deixar que outras pessoas cheguem perto o bastante para ver as costuras, as falhas, as partes de você que ainda não estão prontas. Infinite Darlene se sente assim. Ela ainda não vivenciou o outro lado, a certeza de que, ao não deixarem as outras pessoas chegarem perto demais, você também deixa de ver as imperfeições delas, as costuras delas, o trabalho artístico de criação delas.”

¹ gay-friendly – Termo usado para designar cidades e comunidades onde ser gay, bissexual ou transgênero não é um problema e onde todos são aceitos e abraçados pela populaçãoo.
² Young adult – Livros dos mais diversos gêneros que são voltados para jovens entre seus 15 e 20 anos.
³ Quaterback  É uma posição do futebol americano. Jogadores de tal posição são membros da equipe ofensiva do time (do qual são líderes) e alinham-se logo atrás da linha central, no meio da linha ofensiva.

--- Marcel Elias ---

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