Resenha Especial: Madame Bovary por Gustave Flaubert

Que "Madame Bovary" é um dos clássicos mais famosos do mundo, isso ninguém tem dúvidas. Polêmico ao extremo, desde sua publicação, o livro vai trazer à tona o realismo à literatura, nos entregando uma personagem totalmente dona de si, por mais errada que seja. Venham comigo desbravar mais uma daquelas histórias que, de tão conhecidas, poucos acabam por lê-la.

Título: Madame Bovary
Autor: Gustave Flaubert
Editora: Martin Claret
Ano: 2015
Páginas: 398
Onde comprar: Saraiva
Texto de suma importância, “Madame Bovary” é uma leitura essencial, sendo considerado um dos melhores romances da literatura, sendo, provavelmente, o melhor dos livros do romance realista de caráter psicológico do século XIX. Para mostrar seu mundo, Flaubert põe em cena uma personagem em total desacordo com sua realidade, com sua posição social e com seu sexo. É nessa personagem que se centrarão as ações desenvolvidas na narrativa e os principais dilemas da obra.

"Madame Bovary" foi um livro que causou muito rebuliço na sociedade europeia. Sendo considerado “imoral e corruptor” para mocinhas de família. Isso sem falar que Flaubert foi processado pela Sexta Corte Correcional do Tribunal de Sena, pois tratava de um adultério. E pior, adultério feminino. Mas, como é comum da natureza humana, tal situação só serviu para alavancar as vendas do livro, tornando-o um dos principais romances do Século XIX.

A história se inicia com Charles Bovary. Charles é um rapaz, fruto de um casamento conturbado e infeliz, que demorou mais que o normal para ingressar na escola, isso o fez servir de chacota de alguns dos colegas. Anos depois, Charles vai para a faculdade de medicina, onde vive uma vida boêmia e não dando tanta atenção ao curso (Muito diferente da atualidade, é claro). Aos trancos e barrancos, torna-se médico e acaba por casar-se pela primeira vez com uma viúva, mais velha que ele. A primeira Madame Bovary é uma mulher de algumas poses, porém extremamente ciumenta e controladora. Em determinado período, quando já situado em sua cidade como médico, atende ao chamado de um fazendeiro e consegue curar o abastado senhor de sua enfermidade, ele acaba por visitar a residência do gentil homem e conhece assim sua filha, Emma, um encantadora e meiga donzela, que logo cativa o coração do médico. Sua mulher, extremamente ciumenta, logo fica incomodada, mas pouco tempo depois falece, deixando Charles Bovary viúvo.

Após alguns meses, depois de passado o luto, Charles Bovary acaba por casar-se mais uma vez, agora com a linda Emma. Passamos então a acompanhar a vida desse casal a partir da nova Madame Bovary. Emma é uma garota que foi criada em um convento e, para passar os dias, deleitava-se em romances, o que a tornou uma jovem sonhadora e que idealizava os romances perfeitos dos tantos livros que lia. Temos aqui o ilustre caso de uma pessoa que tinha acesso a literatura, mas que não sabia como se portar com a informação que recebia, o que a tornou, de certa forma, alienada quanto ao tema (soa familiar?). Por idealizar tantas maravilhas, acabou por perceber que a vida de casada não era aquele sonho romântico que soa mente criou, o que a tornou, com o passar do tempo, amargurada quanto ao casamento. Mas, o que fazer? Era mulher, numa época em que mulheres eram totalmente devotas ao marido e ao lar. Eis então o método o escapismo: o adultério!

Diferente do que eu imaginei, por tanto ouvir falar desse conturbado tema, Emma Bovary teve apenas dois amantes: o primeiro, Rodolphe, é um tipo de Bon Vivant do campo. com quem ela tem um caso meramente carnal e que a abandona quando ela almeja mais dele. O segundo, Léon, é um jovem com quem ela teve um affair, antes mesmo de Rodolphe, mas que veio apenas a se concretizar tempos depois, quando se encontrava desgostosa da vida com o abandono do primeiro amante.

Sem dúvida alguma, a grande protagonista da história é Emma Bovary. Ela tornou-se um marco na literatura mundial, pois foi a primeira vez que uma mulher foi descrita com tamanha autonomia e poderio. Madame Bovary é uma mulher forte, não por portar uma arma, ou por trair o marido, mas por, mesmo sentindo-se prisioneira em sua vida matrimonial, tinha total controle de sua vida, ela tem total autonomia e liberdade em suas ações, a tal ponto que conseguimos ver que nem mesmo o autor consegue contê-la, sendo ela mesma a definir o curso de toda sua vida, ate o final.

Um dos pontos altos do livro com certeza é o narrador. Diferente do clássico narrador onisciente de romances do período, o narrador funciona quase como um personagem, levando o leitor a diversas interpretações do mesmo personagem em diferentes momentos da história (Para quem for ler, perceba a primeiras impressões de Charles sobre sua futura esposa e as mesmas primeiras impressões de seu primeiro amante sobre a mesma. Ambas narradas pelo ponto de vista desse narrador).

Outro ponto interessante do extenso trabalho de Flaubert (o livro levou 5 anos para ser escrito, com um tempo de trabalho de aproximadamente 16 horas por dia) é que ele foi o primeiro escritor a pensar a história “por cenas”, um artifício que hoje é responsável por mover a industria cinematográfica. Ele sabia definir e compor os cenários e escrever aquela determinada parte da história. Outro artifício trazido pelo autor também foi o do diálogo entrecruzado, que é quando as falas se unem à narração, não necessitando de expressões que denotem que Áquila frase é um diálogo.

O livro, porém, tornou-se um pouco, por falta de adjetivo melhor, pesaroso para mim por dois motivos.

O primeiro foi a história em si. Apesar de uma mulher forte e claras críticas à religiosidade cega, o livro carrega um tema deveras polêmico, mesmo nos dias de hoje. É óbvio que aquela era uma sociedade muito mais opressora, seja pelo homem, seja pela religião, mas o tema adultério ainda é algo que me traz muita revolta, e, apesar de entender a importância histórica da personagem, Emma Bovary jamais será um exemplo a ser seguido. Suas motivações, paixões e modo de agir são tão egoístas, imaturos e estúpidos que tornou-se muito difícil para que eu tivesse qualquer tipo de afinidade com a personagem. (Para aqueles que também acompanham quadrinhos, eu consigo sentir Emma Bovary em Emma Frost, dos X-Men. Que eu odeio, diga-se de passagem). A história toma rumos absurdos e no final, o sofrimento acabou por cair na personagem que menos teve culpa em tudo, o que partiu meu coração.

Aliás, o outro grande ponto fica justamente nos personagens, não consegui sentir nenhum apego a nenhum deles, fosse por Charles, que era um tolo, fosse pelos amantes, pelos secundários, ou mesmo pela própria Emma. Porém, é interessante observarmos a obra sob o ponto de vista de um crítico literário Austríaco, Otto Maria Carpeaux, quando ele fala que “O verdadeiro personagem desse romance é a estupidez humana”. Isso dá um novo parâmetro a toda a análise da história em si.

Polêmico e controverso, "Madame Bovary" é um livro que vale apena, não apenas por seu peso histórico, mas para nos mostrar como nossos impulsos humanos podem nos tornar infelizes e responsáveis pela infelicidade alheia.

“- Ah sim! – dizia Felicité – A senhora é igual à Guérine, filha do pai Guérin, o pescador de Pollet, que conheci em Dieppe, antes de vir para a sua casa. Ela era tão triste, tão triste, que, quando eu a vi de pé, na porta da casa dela, ela parecia uma mortalha estendida diante da porta. O mal dela, pelo que parece, era uma espécie de névoa que ela tinha na cabeça, e os médicos não podiam fazer nada, nem o padre. Quando isso ficava muito forte, ela ia sozinha para a beira do mar, tanto que o tenente da aduana, fazendo a sua ronda, sempre a encontrava estendida, de barriga para baixo, chorando nas pedras. Depois que ela se casou, tudo isos passou, é o que dizem.
 Mas a mim – disse Emma – foi depois do casamento que isso me aconteceu.” – Pág 143

--- Marcel Elias ---

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