Resenha: Salem por Stephen King

Eu fecho meus olhos e imagino essa cena: King e sua esposa, num domingo tranquilo, conversando banalidades de casal, quando, do nada, ele solta:
- O que aconteceria se o Drácula viesse à Nova York nos dias de hoje? (No caso, anos 70)
- Seria atropelado por um táxi.
Ele concorda e ambos riem. Então ele pondera: "... Mas e se fosse numa cidade rural?"

E eis, meus caros, o início de ‘Salem!

Título: ‘Salem
Autor: Stephen King
Editora: Suma de Letras
Páginas: 464
Ano: 2013
Onde comprar: Saraiva | Submarino
Ambientado na cidadezinha de Jerusalem's Lot, na Nova Inglaterra, o romance conta a história de três forasteiros. Ben Mears, um escritor que viveu alguns anos na cidade quando criança e está disposto a acertar contas com o próprio passado; Mark Petrie, um menino obcecado por monstros e filmes de terror; e o Senhor Barlow, uma figura misteriosa que decide abrir uma loja na cidade. Após a chegada desses forasteiros, fatos inexplicáveis vêm perturbar a rotina provinciana de Jerusalem's Lot: uma criança é encontrada morta; habitantes começam a desaparecer sem deixar vestígios ou sucumbem a uma estranha doença. A morte passa a envolver a pequena cidade com seu toque maléfico e Ben e Mark são obrigados a escolher o único caminho que resta aos sobreviventes da praga: fugir. Mas isso não será tão simples, os destinos de Ben, Mark, Barlow e Jerusalem's Lot estão agora para sempre interligados. E é chegada a hora do inevitável acerto de contas. 


Nossa história começa, em seu prólogo, com um homem e um menino que viajaram por algumas partes dos Estados Unidos, sempre interessados em notícias da pequena cidade de Jerusalem’s Lot, que tornou-se conhecida por virar uma cidade fantasma da noite para o dia. Com o passar do tempo, e perturbado com pesadelos e temores, eles resolvem retornar a esse lugar. A partir daí, temos um flashback, contando a temível experiência de ambos nessa pacata cidade.

O homem, Ben Mears, é um escritor de razoável fama que havia morado há anos atrás nessa bucólica cidade do interior. Ele sempre guardou consigo um medo nessa cidade. Um pavor experimentado por ele em sua infância a respeito da temerosa Mansão Marsten, onde o último descendente dessa família foi encontrado morto, enforcando-se em seu próprio quarto.

Ben esperava com essa visita exorcizar esse antigo demônio de sua memória, adquirindo assim forças para superar o luto oriundo da recente tragédia da morte de sua esposa, em um acidente de carro. Seu objetivo inicial era alugar a casa de seus pesadelos e de lá escrever seu novo livro, tirando de si toda a dor e medo que essas experiências trouxeram para si.

Ao chegar na cidade e conhecer a bela Susan Norton, ele descobre que a casa foi comprada por um estrangeiro misterioso, que está para abrir uma loja de antiguidades na cidade. A partir de então a cidade passa por mudanças drásticas em sua rotina.

Começado o sumiço e assassinato de uma criança local, os cidadãos aos poucos ficam doentes e fracos, passando a adquirir hábitos noturnos e estranhos, até chegar a um ponto em que era visível e inegável a realidade: Seus cidadãos tornaram-se lendárias criaturas da noite! Cabe agora a Ben, o jovem Mark Petrie e mais alguns aliados a missão de erradicar com tal horror.

Vamos começar nossa conversar abordando sobre a inteligente ideia da brilhante pessoa que nos trouxe este livro ao Brasil e que resolveu dar o título de “A Hora do Vampiro” a essa obra. Sutileza mandou lembranças, meu caro! Por sorte a Suma de Letras teve o bom senso de voltar ao título original, que foi como eu conheci essa história. Mas alguém além de mim, que não sabia absolutamente nada do enredo da história, ficou surpreso pela história se tratar de vampiros? Pelo nome, a primeira ideia que me veio à mente foi bruxas. Aplausos para o Rei do Sorvete! (Piada interna do livro)

Como comentei no começo da resenha, essa história surgiu da ideia do King de como seria se o Drácula acabasse indo para uma cidade no interior dos Estados Unidos, durante os anos 70, apesar de que, de acordo com o próprio King, o livro ter um grande apelo político, devido a época de conflitos como o Escândalo de Watergate entre outros. E, também de acordo com o autor, o livro que mais influenciou essa obra foi Os Invasores de Corpos, de Jack Finney, mais do que o Drácula, do Bram Stoker, em si.

Bom, eu não tive a oportunidade de ler o romance de Jack Finney, mas posso atestar que os elementos principais do vampiro mais conhecido da cultura ocidental estão totalmente intrínsecos nesse livro.

Stephen King é um mestre no quesito ambientação. Ele passa páginas e páginas montando um cenário e dando vida a seus personagens, fazendo com que nós conheçamos e nos importemos com ele, só depois destes elementos estarem bem trabalhados ele nos traz o peso do terror e suspense.

Os vampiros que temos descritos no livro detém muito das crendices mais antigas: Fraqueza se expostos ao sol ou a símbolos como crucifixo, necessidade de um caixão e certo poder hipnótico sobre suas vítimas. Eles não perdem suas personalidades de quando vivos, apenas adquirem a inegável fome por sangue e se tornam mais frios em relação aos vivos, vendo-os como presas.

A temática abordada pelo King também é excelente. Ele faz uma pequena crítica a cidades pequenas, ao ser humano e também à religiosidade, que por vezes nos afastam do verdadeiro sentindo da religião. Em uma das minhas passagens favoritas o próprio vampiro-mestre dá uma lição de religiosidade tão incrível que eu quase aplaudi de pé!

Mas se há um elemento que amo nos livros do King, fora a ambientação, é sua habilidade de criar personagens. Não lidamos aqui com pessoas artificiais, perfeitas ou com protótipos feitos para contracenar o papel no romance. Lidamos com gente. Pessoas que poderiam ser eu, ou mesmo você que está lendo essa resenha. Elas são falhas, tem sonhos, frustrações e são tão bem descritas que não tem como criar um vínculo. E nesse livro não é diferente.

E não se enganem, apesar desses personagens humanos, ambientação perfeita e trama envolvente, o terror vai estar lá sim!

São várias as cenas em que eu tremi dos pés à cabeça e tive que olhar por sobre o ombro. Barlow e seu escravo dão um peso no clima de terror que chega a exalar pavor e diversas passagens trazem aquele medo que muitos já perderam de vampiros, por conta de determinadas obras mais atuais. Todo aquele climão gótico do livro do Bram Stoker está lá, deixando sua nuca arrepiada e sua testa gotejando de suor!

‘Salem é uma experiência. Ele é um resgate do medo de uma criatura sobrenatural que acabou tornando-se quase cômica, devido ao mau uso. Para aqueles que procuram por uma boa história de vampiros e andam se decepcionando, Stephen King nos brinda com o mais clássico dos terrores de uma geração que não ousava sair de casa sem seu crucifixo e sua água benta.

“É tarde demais para esse melodrama – disse Barlow em meio à escuridão. Sua voz era quase pesarosa. – Não é necessário. Você esqueceu a doutrina da sua Igreja, não é? A cruz... o pão e o vinho... o confessionário... São apenas símbolos. Sem fé, a cruz é apenas madeira; o pão é apenas trigo Assad; o vinho, uvas amargas. Se tivesse abdicado da cruz, teria me derrotado mais uma noite. De certo modo, era o que eu esperava. Faz tempo que não encontro um adversário de valor. O menino dá dez de você, falso padre.” – Pág. 383

--- Marcel Elias ---

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