Mulheres nos Quadrinhos | Parte #2: Sexismo x Feminilidade x Feminismo
Continuando nossa conversa sobre mulheres e como elas são
representadas em quadrinhos, hoje quero conversar sobre algo que venho me
questionando: O que faz uma personagem ser ou não forte?
Há algum tempo, a vlogueira (favorita dessa pessoa que
vos escreve) Verônica Valadares,em uma postagem no seu blog, redigiu um texto em que ela aborda seu
incômodo com um gifset de “mulheres fortes”, em que há uma seleção de
personagens femininas aclamadas pelo publico, conhecidas por suas habilidades
marciais e/ou em cenas que estão destilando sex
appeal enquanto portam armas ou socam alguém. Resumindo bastante o texto,
ela nos traz o questionamento: É mesmo necessário que uma mulher precise
agredir alguém para ser considerada forte?
Pode parecer estranho que eu, um homem, me incomode com
isso, mas ao ler o texto logo quis passá-lo para meu universo de escape: Os
quadrinhos.
Diferente de alguns segmentos, os quadrinhos de
super-heróis, ao longo de seus mais de 70 anos de disseminação pelo globo, tem,
a meu ver, 2 tipos gerais de personagens femininas:
Garota secundária, geralmente interesse romântico, que serve
para alavancar o herói. Ela pode ser a vizinha, a secretária ou mesmo a amiga
de infância e é a “gata dos sonhos” do mesmo. Não tem papel nada significante
na história e por muitas vezes está lá para ser resgatada das mãos do vilão
cruel. É um estereótipo mais antigo, mas ainda muito disseminado em várias
histórias.
Garota, geralmente muito bem apessoada com tributos físicos,
que preenchem muito bem suas mínimas roupas e/ou sensuais roupas coladas que
pela lógica não trás nenhuma proteção ao combate ao crime. São em sua maioria
“mulheres frias, mas que na verdade não querem demonstrar fragilidade”. Chutam,
socam e empunham armas em poses tão sensuais que poderiam muito bem ser usadas
em revistas masculinas.
A meu ver, qualquer uma dos dois estilos traçados acima são
vazios. Antigamente era difícil falarmos sobre isso. Sejam como consumidoras,
roteiristas ou mesmo desenhistas, a
participação das mulheres nesse nicho é relativamente novo. Antes tínhamos
homens escrevendo e desenhando para outros homens, em um universo que
“transbordava testosterona”. Então mesmo as heroínas mais interessantes
acabavam se tornando figuras quase vulgares. Com a entrada de mulheres nesse
nicho, precisávamos agora dar força a personagem. Qual foi o jeito? Cortem as
mocinhas delicadas. Armas, frases de efeito e cara de top model em todas, por
favor.
Então, trazendo a reclamação da Verônica para os quadrinhos,
estaríamos num ponto que uma heroína não pode ser feminina, usar vestidos e ter
sonhos pueris, sem ser taxada de fraca, mulherzinha e alienada?
Certo, é meio complicado inicialmente se você para pra
pensar que em histórias de super-heróis, por mais bem boladas que sejam, vai
ter algum tipo de confronto sim entre os personagens, mas é justamente aí que
está a graça, pois temos exemplos ótimos de personagens que foram muito bem
feitas e acabaram transformas em sex simbol badass. (Lembram-se da minha
reclamação no post anterior, sobre a descaracterização dos anos 90?)
E o primeiro que me vem a cabeça é a Psylocke...
Elizabeth Braddock, telepata importada da terra da Rainha,
irmã gêmea do mais poderoso super-herói da Inglaterra, o Capitão Britânia. Em
suas primeira aparições nos X-Men, Betsy era a verdadeira lady inglesa. Em suas primeiras aventuras, ela teve que enfrentar Dente
de Sabre, sem qualquer reforço e nem treinada. Teve que usar de toda sua
inteligência contra um cara que se distrai caindo no braço com o Wolverine!
(Tudo isso num vestido e de salto, vale ressaltar). E, caramba, o segundo traje
da mulher era uma armadura quase ao nível Inglaterra Medieval!
O que fizeram com a personagem? Mudaram sua nacionalidade e
encurtaram seus trajes a níveis ridículos! Sim, meus caros, Psylocke foi vítima
de fetichistas que estavam descobrindo o oriente... Mas quem liga? Ela agora
usa uma katana e espanca mais caras que o Wolverine. Por que se preocupar com
quaisquer transtornos que essas mudanças trouxeram a moça? (E não venham me
dizer que as três páginas que eles falaram sobre isso foi o suficiente).
E isso não se limita à Psylocke. Quais as mulheres mais
conhecidas da Marvel? Mulher Aranha, Miss Marvel, Mulher Hulk, Viúva Negra,
Elektra, Gata Negra. Todas são mulheres consideradas fortes, pois estão na
linha de frente, batendo em todos com seus trajes justos moldando seus corpos.
Por que mulheres como Pepper Potts, Gwen Stacy ou Mary Jane
são consideradas fracas? Só por que não podem dar três dúzias de pontapés
ensaiados em um vilão?
Isso sem falar das personagens que são inteligentes e
sagazes, mas que são transpostas aos clichês retrógrados! Detesto a personagem,
mas é mesmo necessária que Emma Frost saia por aí chutando caras usando os
espartilhos da sua época de Clube do Inferno? Eu consigo entender o apelo da
personagem naquela época, mas já aprendemos que os tributos da Ex-Rainha Branca
está em sua sagacidade, não em um par de seios e poses de luta.
Mas nem tudo está perdido. Preciso falar que a tempestade é uma personagem completa? Sim,
ela teve seus trajes colados, mas creio falar por todos que a personagem é
muito mais lembrada por seus dilemas, ao longo da carreira. Ela foi de deusa, a
amiga, a líder. Teve sua época que, ao perder seus poderes, teve que passar por
todo um processo de autoconhecimento que não foi nada bonito, sem falar de um backstage digno de pena (Ou vocês acham
que ser escrava psíquica do Rei das Sombras é para qualquer um?)
Minha personagem favorita da vida, a Jean Grey. Ela começou
no estereótipo de interesse romântico e atingiu o patamar de criatura mais
poderosa do universo Marvel! Querem saga mais complexa que a Saga da Fênix
Negra, que apresenta uma personagem que precisa lidar com sua dualidade ao
nível “Lago do Cisne”? (Sim, estou fantasiando um balé dessa saga, me
deixem) E que depois as pessoas passaram anos chamando-a de fraca por ter
se casado e “ficado na sombra do marido”. Vamos lá, pessoal, Scott Summers pode
até ser um bom líder, mas se tratando de relacionamentos, ele nunca foi o “cabeça
da relação”!
Eu poderia dar mais uns 10 exemplos de mulheres aqui, mas
vou me ater a esses.
Em suma, a mulher ganhou muito espaço durante o longo dos
anos, é um fato, mas ainda temos muitos preconceitos a serem vencidos. Ao meu
ver, como heroínas, elas podem sim chutar, bater, mas nada as impede de serem
donas-de-casa, suporte, médicas, CEO, Diretoras, Professoras ou lidar com parte
administrativa. Ser uma “personagem forte” vai muito além estar na história para
deleite masculino.
A verdade é que, homem ou mulher, sua força está em sua
capacidade de lidar com uma situação, não qual seu estilo de luta, super-poder
ou traje de combate!
E vocês, pessoal, me
digam: Já teve alguma personagem que incomodou por ser só um sex simbol? O
que vocês acham sobre a personagem ser feminina neste mundo em que super-heróis
estão dominando o entretenimento?
--- Marcel Elias ---
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