Resenha: Na Natureza Selvagem por Jon Krakauer

Um livro intenso e arrebatador. É tão difícil escrever sobre ele em poucas palavras que posso adiantar para vocês que tenham paciência durante a leitura desse texto, pois tentarei de todas as formas sintetizar o que senti nesse pequeno espaço.

Título: Na Natureza Selvagem
Autor: Jon Krakauer
Editora: Companhia das Letras
Ano: 1998
Páginas: 213
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Na natureza selvagem, de Jon Krakauer, autor do best-seller No ar rarefeito, traz uma história real. O corpo em decomposição de um jovem é encontrado no Alasca. A polícia descobre que se trata de um rapaz de família rica do Leste americano que largou tudo, se internou sozinho na aridez gelada e morreu de inanição. Quem era o garoto? Por que foi para o Alasca? Por que morreu? Para responder a essas e outras perguntas, Jon Krakauer refaz a trajetória de Chris McCandless, revelando a América dos que vivem à margem, pegando carona ou circulando em carros velhos, vivendo em acampamentos e cidades-fantasmas. Mergulha no mundo da cidadezinha rural, onde homens rudes bebem e conversam sobre o tempo e a colheita. Compara a história do jovem com a de outros aventureiros solitários que tiveram fim trágico. O resultado é uma narrativa envolvente, por vezes amarga, em que os sonhos da juventude se transformam em pesadelo.


Ônibus em que Chris McCandless viveu e morreu no Alasca


Durante muito tempo desconheci completamente a história de Chris McCandless. Sua vida e sua morte, me eram tão estranhas quanto distantes. Entretanto, há algum tempo me deparei com o livro "Na Natureza Selvagem" e me senti profundamente impactada com o título. Eu não sabia do que ele tratava e ainda não tinha tido nenhum contato com o autor Jon Krakauer para pelo menos imaginar o que as páginas continham. Diante desse completo desconhecimento, adquiri o livro como um presente de aniversário adiantado, mas ele acabou ficando parado muito tempo na minha estante ainda que me chamasse tantas vezes para uma aventura. E depois de um longa temporada recusando o seu chamado, eu cedi e tive uma das maiores experiências da minha vida proporcionada por uma obra de pouco mais de duzentas páginas.

Chris McCandless é um jovem americano com pensamentos pouco comuns para alguém que tinha a estrutura familiar e educacional que ele possuía. Desde cedo ele mostra ser fora dos padrões, e, ao contrário do que se pensa, a sua experiência de viajar sozinho antecede a sua odisseia alasquiana. Vindo de uma família de classe média e já com uma formação universitária, ele vai de encontro ao desejo de sua família e não embarca no projeto que o seu pai tinha, que era de vê-lo formado em Direito, e doa todo o seu fundo estudantil para realizar uma jornada em que ele buscava muito mais que uma mera aventura. O que ele queria exatamente, é algo que jamais saberemos com absoluta certeza, pois apesar de ter conservado um diário onde relatou detalhes de seu cotidiano fora de casa, ele nunca chegou a divagar sobre o assunto. No entanto, é possível supor que ele buscava encontrar na natureza selvagem um caminho que o levasse a um lugar mais longe dentro de si mesmo.

Obstinado a viver com aquilo que poderia conseguir através do esforço próprio, Chris caçava e colhia frutos silvestres

Se perder em si. Foi isso que ficou martelando na minha cabeça durante muito tempo depois que passou a minha vontade de chacoalhar o Chris intensamente por causa de seu modo ingênuo de encarar uma vida na estrada. Eu me coloquei tantas vezes no lugar da família dele que eu não conseguia ver com admiração o que ele estava fazendo apesar de ter ficado claro que aquilo era algo grandioso para alguém tão jovem. Entretanto, quando meus ânimos se acalmaram pude perceber que Chris precisava não só de respostas, como também, uma maneira de perdoar os seus pais por toda a culpa que ele atribuía a eles. Por certo, está claro que poucas pessoas tomariam a mesma atitude que ele, porém, cada um tem um jeito diferente de lidar com a dor e a maneira dele era sair pelas estradas buscando a verdadeira paz de espírito.

O fato de que para encontrar o que buscava, ele tivesse que se colocar em uma situação arriscada, talvez se explique com a filosofia de vida que adotou, pois sendo um leitor voraz, ele tentava seguir os passos de autores como Liev Tolstói (principalmente no que se refere a sua maneira de enxergar a sociedade à sua volta) e Jack London (através dos seus relatos da relação entre homem e natureza), entre tantos outros que ditavam o tom da sua concepção do que é viver com intensidade e finalidade. Apesar de ser muito jovem, ele conseguiu influenciar de forma bastante admirável a vida das pessoas com quem teve contato desde que saiu da casa, pois tendo que trabalhar para conseguir seu sustento enquanto atravessava o país rumo ao Alasca, ele não só fez amigos, como também, mudou a vida de muitos deles mesmo que sua aparição tenha sido tão rápida e passageira. Seu jeito encantador e apaixonado pelo que acreditava, fez com que muitas pessoas repensassem a própria maneira de viver.

Ao final dos 100 dias que permaneceu na natureza selvagem, Chris havia perdido muito peso e estava desnutrido

Narrado em forma de relato, o autor Jon Krakauer traz não só aspectos da vida do Chris como também da sua própria, pois tendo muito coisa em comum com essa figura icônica, ele também lança luz a uma época de sua vida em que largou tudo para escalar um pico no Alasca. Por vezes, me senti perdida com alguns termos utilizados pelo autor, mas no final, consegui entender a forte ligação que ele estabeleceu com Chris mesmo conhecendo os seus feitos após a sua morte. Trazendo trechos de diários, cartas e postais que McCandless enviou para algumas pessoas que ele se conectou, percebemos que nem mesmo a distância o persuadiu a procurar a sua família antes que ele alcançasse aquilo que buscava. E é esse o aspecto mais triste de sua história: saber que ele entendeu que a felicidade verdadeira deveria ser compartilhada mas que nunca pôde vivenciar isso porque morreu.

É certo que a relação entre ele e os seus pais era extremamente delicada, principalmente porque com um comportamento taciturno e reservado, Chris jamais revelava o que se passava em sua mente mesmo ela estando povoada de ideias sobre a sua família. E mesmo esse distanciamento ser algo latente, ainda mais no que se refere ao seu pai, foi um tremendo baque para os pais dele a notícia de sua morte depois de passados dois anos desde a sua saída de casa. Deve ter sido mais duro do que qualquer um de nós possa julgar... Ainda mais quando acrescido a isso, havia a constante suspeita de que morrer havia sido o objetivo inicial do Chris. A verdade é que mesmo as circunstâncias da morte dele não estando muito claras, tendo a pensar que ele não estava em uma empreitada suicida como muitos julgam. Egoísta e perigosa sim, mas a ingenuidade do Chris não permitia que ele enxergasse o real perigo que estava se colocando. Ele realmente se achava capaz de viver da natureza em um ambiente naturalmente hostil e mortal.

Chris já no Alasca, sentado em frente ao seu "ônibus mágico"

Além disso, vale lembrar que "Na Natureza Selvagem" virou filme cuja direção e roteiro ficaram por conta de Sean Pean e apesar de ter sido lançado em 2007, eu ainda não vi. Pelos comentários que li a respeito, o longa-metragem faz jus à história de Chris, no entanto, por ora não me sinto preparada para revisitar os acontecimentos que tanto me abalaram. E é diante de toda essa profusão de acontecimentos e sentimentos que eu sinto que por mais que eu fale, nunca conseguirei esgotar as possibilidades que passam pela minha mente sobre todas as nuances que pincelam essa, nas palavras de Chris McCandless, odisseia alasquiana. Só espero sinceramente que um dia sua família consiga entendê-lo completamente, pois apesar das várias camadas que ele tinha, ele era um jovem homem admirável e que se tivesse sobrevivido a essa jornada, teria muito para ensinar aos outros.

Ademais, a verdade é que sinto que mesmo esse sendo um livro extraordinário, nem todos os que se propuseram a lê-lo irão gostar. Não porque o seu conteúdo seja difícil de entender ou por ser pouco plausível, mas sim porque há elementos demais que impulsionam o leitor para um abismo onde ele terá que decidir se saltará de cabeça e aceitará o Chris com toda a sua intensa carga emocional e filosófica, ou se permanecerá observando-o do alto e por conseguinte, julgando as suas atitudes de modo distanciado. Então, digo-lhes sem medo de estar errada: se decidir ler "Na Natureza Selvagem" se permita mergulhar na vida pouco comum do jovem McCandless e eu prometo que terá uma das experiências mais extravagante, enriquecedora e fantástica de sua vida.

Tanta gente vive em circunstâncias infelizes e, contudo, não toma a iniciativa de mudar sua situação porque está condicionada a uma vida de segurança, conformismo e conservadorismo, tudo isso que parece dar paz ao espírito, mas na realidade é mais maléfico para o espírito aventureiro do homem do que um futuro seguro. A coisa mais essencial do espírito vivo de um homem é a sua paixão pela aventura. A alegria da vida vem de nossos encontros com novas experiências e, portanto, não há alegria maior que ter um horizonte sempre cambiante, cada dia com um novo e diferente Sol. Págs. 67 e 68

--- Isabelle Vitorino ---

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